Era fim de tarde, eu realmente não queria falar sobre o que eu havia feito a poucos dias antes, acho que uma temporada em um quarto branco já tinha sido mais do que o suficiente pra eu cair na real de que se eu tivesse que fazer algo, teria que fazer direito. Sophia estava ao meu lado naquela tarde, ela não parecia nada bem, era como se tivesse passado noites sem dormir e seus olhos demonstravam que ela havia chorado por algum tempo. Era inevitável fugir do assunto, mas eu queria poder fazê-lo, não estava bem pra falar sobre nada naquele momento, eu sinceramente só queria poder ficar ali imóvel e em um estado de inércia observando o fim do dia chegar, mas Sophia não merecia nada daquilo e eu sentia dentro de mim que ela precisava de algumas respostas sobre o que esperar do futuro.
Foi quando eu decidi quebrar o silencio e falar alguma coisa.
-Acho que vamos ter um pôr-do-sol realmente interessante hoje. Não acha?
Disse em um tom suave e delicado, com um tom humorado e pratico.
-Não me venha falar sobre o tempo, se é que ainda temos tempo. Você é tão confuso e complicado Erick, a gente nunca sabe o que esperar de você. Às vezes quando tudo parece bem, você vai e mostra que ninguém nunca ira te conhecer de verdade. Isso machuca todos ao seu redor, é a atitude mais egoísta que um ser humano pode ter, é a decisão mais covarde que alguém pode tomar.
Ela respondeu seria, como se tentasse segurar algo dentro de si, talvez ela quisesse chorar ou talvez quisesse apenas ser sensata e firme no que precisava dizer.
-
Mas tudo bem pra todo mundo isso, vocês não se importam, o importante pra vocês é que eu pense no que há de errado em eu chegar aos meus 90 anos comigo mesmo, não é? Porque o que me rasga por dentro pouco importa, desde que eu esteja aqui suportando tudo e arrumando a bagunça de todo mundo. Eu apenas não consigo mais ser tão boa e tão ruim ao mesmo tempo, talvez eu seja mesmo egoísta e covarde talvez isso fosse à única coisa que ela sabia com toda certeza sobre mim.Eu disse em tom rude, neutro e inexpressivo. Meus olhos ferviam através da revolta e do ódio, meu coração disparava ao cogitar dizer aquele nome.
-Não há problema nenhum em você chegar aos seus 90 anos apenas com você, o problema é você chegar a essa idade com você mesmo, sabendo que tem tanta gente que te quer e que te da valor! Que realmente se importam com você, que te amam com todas as suas imperfeições e qualidades.
Ela disse com um ar defensivo e melancólico, como quem sente doer só de imaginar um mundo sem minha presença. Disse como se tivesse levado um tapa e estivesse tentando se defender.
-Talvez as pessoas realmente me dêem algum valor, mas não sei ao que dão valor. Eu não vejo nada que realmente mereça algum valor, eu sou apenas um bastardo e miserável. Incapaz de fazer ate mesmo as pessoas que eu amo, feliz. Não vejo motivos pra alguém gostar de mim de verdade.
Respondi novamente em um tom seco e inexpressivo, com a certeza de que estava com aquela expressão indecifrável no rosto.
-Que isso, há muitas pessoas que gostam de você. É só que talvez você esteja olhando pro lado errado.
Ela disse em um tom sereno enquanto me observava com um olhar amável e tristonho ao mesmo tempo.
-Ou talvez seja só que eu não esteja mais conseguindo ou querendo olhar pra lado nenhum...
Senti meus olhos lavarem toda a inexpressividade do meu rosto, dando lugar a aquela típica expressão infantil e costumeira de tristeza e dor. Uma dor tão profunda que silencia.
-Olha, eu acho que... Não deixa...
Ela me puxou pra perto de si e me envolveu em um abraço amigável e repleto de carinho, talvez por não saber o que dizer. Talvez por entender que não há nada a se fazer, mas ainda sim, ela escolheu a melhor maneira de me confortar naquele momento. E talvez naquele momento fosse tudo o que eu precisava...
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